Entrevista | Meiry Martins: o cristianismo e a comunidade LGBTQIA+

O mês do orgulho LGBTQIA+ findou-se, mas nem por isso deixaremos de tratar sobre alguns assuntos que possuem extrema relevância e que necessitam entrar em debate, independente do período que possamos estar vivendo. E na edição desta semana, temos uma convidada pra lá de especial, que tirou um tempinho para conversar com a Freezone e nos apresentar seu ponto de vista acerca da relação entre a comunidade e a Igreja.

Apresentando…

Meiryelle Martins – também conhecida como Meiry –, tem 30 anos, nasceu em Angra dos Reis, mas atualmente reside na cidade do Rio de Janeiro. É cantora e compositora. Para conhecer mais do seu trabalho clique aqui e confira suas produções e covers. Não é por nada não, mas essa voz é de arrepiar dos pés à cabeça e a paz que traz é sem fim.

Reprodução: Thony Cruz

Não é novidade para ninguém que a Igreja e a comunidade LGBTQIA+ possuem discursos divergentes acerca de seus princípios e os debates tem sido recorrentes e intensos, a respeito de diversos tópicos, como casamento gay, a expressão de afeto em espaços públicos, a condenação e o castigo eterno aos quais o esperam e assim prossegue.

Mas passeando pela Internet, me deparei com essa pedra preciosa em forma de gente. Seu nome? MEIRY! E através de conversas, confissões e muito amor, encontrei alguém que vive e prega a genuidade do Evangelho e do amor de Cristo para com a humanidade, independente da sexualidade. Com isso, convidamos a Meiry para um bate-papo super bacana com a revista e tenho certeza que vocês, nossos queridos leitores, irão amar. Confira abaixo!

Fz: Nos conte um pouco mais de você. Como tem sido a sua vida na igreja e o que você retém de bom na sua caminhada cristã?

• Meiry: Bom, já faz mais de 12 anos que eu não frequento uma igreja, rsrsrs. Mas ainda assim sou uma mulher nascida e criada no Evangelho, e minha caminhada de fé não se desviou muito daquilo que me foi ensinado. Tudo em mim é de crente, o jeito de pensar, de falar, de me relacionar, não sei nem dizer o que eu trouxe de bom ou de ruim nessa bagagem, porque tá tudo misturado.

Fz: Tenho comigo que toda pessoa criada na igreja acaba sendo moldada a uma forma específica de pensar sobre determinado assunto, o que mais a frente ou você se questiona, ou você aceita como a sua verdade absoluta. Baseado nisso, eu queria saber como foi a sua desconstrução acerca da sua visão sobre a comunidade LGBTQIA+, sendo uma mulher cristã.

Meiry: Desde criança eu sempre convivi com LGBTs. Vários coleguinhas meus da própria igreja vieram a se assumir na adolescência. No meu coração eu sentia que não havia nada de errado em ser gay, lésbica, travesti, mas a minha Bíblia, e o pastor, e todo mundo na igreja dizia o contrário. Eu me recusava a acreditar que meus amigos iam para o inferno só por serem do jeitinho que eles eram, e por um tempo cheguei a ignorar algumas passagens da Bíblia que supostamente falavam sobre a homossexualidade como um pecado abominável. Só que para mim, mulher cis hétero, é muito fácil pular certas páginas da Bíblia e seguir com a minha vida. Para um adolescente LGBT isso não é tão simples, aquela página que eu passei batido, é simplesmente a condenação dele ao sofrimento eterno, nessa vida e, principalmente, depois daqui. E talvez por isso, tantos adolescentes tentam se suicidar quando se entendem LGBTs dentro da igreja. Talvez por isso, nós somos um país onde 87% da população se declara cristã, e também somos o país que mais mata LGBTs. Não é preciso ser muito genial para entender que tem alguma coisa muito errada na maneira como nós lemos (ou nem lemos) as escrituras, se essa leitura (ou não leitura) está promovendo a morte, e não a VIDA. Ultimamente meu processo de desconstrução está sendo buscar maneiras de ler a Bíblia bem diferentes daquela forma violenta e homofóbica que leram para nós a vida toda.

Fz: Há algumas instituições denominadas “igrejas inclusivas” que buscam abraçar jovens que assumiram a sua sexualidade e não se sentiram acolhidos pelas ditas “igrejas tradicionais”. O que você acha acerca disso? Acha necessário a abertura de novos espaços ou acredita que as igrejas já existentes precisam de uma nova adaptação e interpretação?

Meiry: Eu desconfio dessas igrejas que se dizem inclusivas. Inclusiva até que ponto? O casal gay pode assistir o culto de mãos dadas? A mulher trans pode pregar no púlpito? A adolescente lésbica pode dar aula na escola dominical? Se essa igreja, que se diz inclusiva, afirma a diversidade criada por Deus e amplifica as vozes dos seus membros LGBTQIA+, eu acho sim esse espaço super necessário. Quanto às igrejas que não recebem LGBTs como membros eu não tenho nada a dizer, Frida Khalo já disse tudo: “Onde não houver amor, não te demores”.

Fz: Como você acha que deva ser a posição dos líderes de jovens acerca dos cristãos que se assumem LGBT?

Meiry: Vamos supor que eu seja uma líder da mocidade, só um exemplo, e uma jovem me diz que é Assexual (letra A do LGBTQIA+). A primeira coisa que eu faria, seria admitir que eu não sei nada sobre ser assexual, então eu escutaria tudo o que ela tivesse a me dizer sobre como é ser quem ela é. Depois de escutá-la eu iria estudar. Conheci há pouco tempo a Teologia Queer através da Reverenda Ana Ester, eu acho que eu buscaria aprofundar meus estudos para me qualificar e conseguir ser uma boa líder pra essa jovem, para protegê-la e guiá-la na sua caminhada de fé enquanto LGBT. Isso é o que eu faria.

Reprodução: Thony Cruz

Fz: Você já sofreu alguma crítica ou ataque por conta do seu posicionamento/pensamento por religiosos mais tradicionais?

Meiry: Sim. Quando eu comecei a me posicionar com mais firmeza, mais clareza, sem meias palavras, sem tentar ficar em cima do muro, sabe? Quando eu escolhi um lado eu desagradei o outro lado, e também os que ficam ali tentando ser neutros. Perdi seguidores, perdi amigos, perdi contato com familiares, perdi dinheiro, e por aí vai. Mas bem aventurados os que tem fome e sede de justiça não é mesmo? Porque nós seremos fartos! Sigo incomodando essa sociedade hipócrita, igualzinho Jesus fazia.

Fz: Qual a sua percepção acerca do olhar de Deus para a comunidade LGBTQIA+? O que é de fato condenável aos olhos de Deus, na sua opinião?

Meiry: Quem sou eu pra achar alguma coisa condenável sobre ser LGBT se nem Jesus achou? Hahaha Deus está na comunidade LGBT, ele não olha de longe, ele está entre vocês, ele sofre com vocês, ele é crucificado todos os dias com vocês.

Fz: Para terminar, você gostaria de deixar alguma mensagem para os jovens que foram excluídos de sua denominação e não se sentem acolhidos?

Meiry: O mundo é uma merda pros LGBTs mesmo. E a igreja é pior ainda. Mas Jesus venceu o mundo por vocês. Ele morreu para que você, LGBT, pudesse andar de mãos dadas com a sua parceria na rua. Ele morreu para que você tenha vida em abundância fora desse armário! Ele morreu pra que você pudesse levantar bem alto a sua bandeira colorida para a glória de Deus! Então não se diminua para tentar caber em lugares dos quais Jesus já te libertou. Amém?

Reprodução: Thony Cruz

CAN I GET AN AMEN IN HERE? AMEN! 🙌🏼

Bem… Acho que eu não preciso dizer muita coisa, né?! Meiry, a revista Freezone te agradece imensamente pelo convite aceito e por você ter doado seu tempo e suas riquíssimas e edificantes palavras para o nosso público. Que a sua verdade se estenda de geração em geração, que este amor tão genuíno e moldado por Cristo alcance a tantos outros e que a sua vida seja repleta de bençãos e grandes conquistas. Um beijo enorme no seu coração! Aqui, você será sempre lembrada por nós. Te amamos! <3

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