Cinema independente: estudantes enfrentam dificuldades na produção cinematográfica

Falta de locais de exibição, falta de investimento e de valorização são apenas alguns dos problemas.

O cinema independente é, na teoria, um tipo de produção cinematográfica feita com baixo orçamento, sem o envolvimento de um grande estúdio. Grande parte dessas produções não é exibida nas salas de cinema, e sim em festivais, na internet ou outros espaços alternativos de exibição. Dados do Observatório do Cinema e do Audiovisual, vinculado a Ancine, apenas 6,9% dos municípios brasileiros possuem salas de cinema.

Clipe “Calma”

A estudante de cinema e jornalismo da PUC-Rio Ericka Levigard aproveitou uma tarefa da disciplina de edição em cinema e produziu um clipe para a música “Calma”, do cantor João Vaz. Para ela, a música fala sobre reaprender a viver sozinho depois de um término.

O clipe vai contar a história de Pedro e Lia, um casal que se separou e a vida de ambos continuaram. Mas Pedro ficou tão preso naquele relacionamento que não percebe essa mudança. Através da história do casal e da parte de Pedro, a estudante explica que um dos objetivos com o clipe foi de transmitir as sensações e os sentimentos que as cenas passavam.

Personagens Pedro e Lia, interpretados por João Francisco Mendes e Júlia Muniz. | Foto: Ericka Levigard

Ericka diz que se inspira muito no trabalho do ator e cineasta Jordan Peele. Para o clipe, ela buscou referências em cenas da série Euphoria, para transmitir os sentimentos através de luzes e cores, e uma referência do clipe “Sleep On The Floor” da banda The Lumineers, que também fala sobre relacionamentos. A estudante diz que, com o clipe, quis provocar uma dúvida no espectador se a história realmente tinha acontecido ou não.

Ericka brinca com a psicologia das cores em diversas cenas do clipe | Foto: Ericka Levigard

“Então a minha intenção, muitas vezes, não é a percepção do público. E eu acho que isso é uma das coisas mais bonitas da arte: a capacidade de criar e de tocar da maneira que tiver que tocar, porque cada um, tem um repertório diferente, né? Então esse repertório influencia diretamente da percepção daquela obra de arte”, explica Ericka.

A estudante diz que acredita que os maiores desafios para artistas no Brasil é lidar com a falta de apoio público e do governo. “Porque muitas vezes as próprias pessoas não valorizam a arte, enxergam o artista como uma pessoa que não quer nada com nada”, lamenta. Já no lado pessoal, ela enfrentou problemas como falta de equipamento profissional para a gravação do clipe. Ela ainda ressalta a importância de artistas independente mostrarem a sua arte para o mundo.

Cinema independente - clipe Calma
Gravação do clipe de “Calma”. Por trás das câmeras, Lucas Peçanha, Ericka e Marina Leal | Foto: Ericka Levigard
Ela não vem mais para o jantar

Assim como Ericka, Gabriel Lopes também quer atingir o público de alguma forma. Em um momento de dificuldade financeira e em pleno cenário pandêmico que se instalou em 2020, o estudante de cinema da PUC-Rio teve a ideia de produzir um curta-metragem para retratar a real cenário da política nacional. Com o objetivo de contar um pouco sobre como essa política se solta do povo, e como esse povo desconhece a mesma, ele se inspira muito no cinema de Walter Salles, pelo cineasta retratar muito a vida na periferia.

“É um cenário caótico no qual foi muito propicio para você pensar dessa forma, para nascer essa ideia e para nascer sobre o que é esse filme. Então era muito desesperador você conhecer pessoas e as vezes também ir ao mercado e ver que o seu dinheiro não dá conta de comprar o básico para você ficar em casa. Então eu queria saber de outras lentes e a partir de outras pessoas de como as imagens das ruas contavam tudo isso que eu sentia”, explica Gabriel.

Ele ainda conta que gravou o “Ela não vem mais para o jantar” inteiramente pelo celular em cenas corriqueiras da rotina, como dentro do ônibus, do metrô ou na rua. Mesmo assim, o estudante diz que um dos maiores desafios que enfrenta é a falta de equipamento profissional – assim como Ericka – e dinheiro. “Eu acho que quando você produz cinema, você sempre vai querer buscar a maior qualidade possível para contar as suas histórias”, diz Gabriel

“Alguns tipos de imagem ou alguma visão de um plano que você colocou na sua cabeça, infelizmente não vai ter como ser gravado com o seu celular. E isso é uma das barreiras. Quando eu estava fazendo esse curta, eu não tive realmente nenhuma barreira porque eu queria o imediatismo, o que o celular poderia ver naquela situação”, explica.

As produções independentes já valorizam a área do cinema por si só, mas essa valorização também precisa vir de investimento de órgãos públicos, do próprio telespectador e de oportunidades.

“Quem faz arte, seja cinema, pintura, música, ou o que for e vem de origem periférica, que veio dessa classe não privilegiada em questões financeiras, é um milagre por si só”, conclui Gabriel.

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