Investigação apresenta venda ilegal de terras da Amazônia no Facebook

Documentário feito pela BBC News Brasil mostra venda ilegal de pedaços de terra da Amazônia em grupos do Facebook

O repórter João Fellet, da BBC News Brasil, iniciou em 2020 uma investigação ao encontrar anúncios no Facebook, com vendas ilegais de pedaços de terra da Amazônia. O documentário foi postado na última sexta feira(26) no canal do Youtube da BBC News Brasil e transmitido mundialmente pela BBC.

A investigação é feita em Rondônia, Estado que tem o maior índice de conflitos por terras e desmatamento da Amazônia, e que teve 72% dos votos para Jair Bolsonaro que prometeu usar as riquezas do bioma para bem da população.

As áreas anunciadas se tratam de terras protegidas por lei por estarem em unidades de conservação e de terras indígenas, são áreas de domínio público e que são destinadas unicamente a populações tradicionais, mas que estão a venda por milhões de reais.

O documentário mostra que o mercado ilegal de terras na Amazônia está aquecido com a perspectiva de que o Congresso anistie invasões recentes e permita que invasores obtenham os títulos das áreas.

A investigação que deu início ao documentário Amazônia á venda: o mercado ilegal de áreas protegidas no Facebook, apresenta as estratégias usadas pelos vendedores para burlar a fiscalização e revela também como a grilagem, ocupação ilegal de terras públicas, avança na Amazônia.

Câmera escondida

De acordo com o documentário, a maioria dos anúncios eram na região de Rondônia. Quase completamente coberto pela Floresta até 1980, ja perdeu cerca de 1/3 de suas matas nativas. Na investigação, para saber se de fato as terras existiam e como seria feito o processo, a equipe da BBC com uma câmera escondida, se encontrou com 4 vendedores se passando pela assessoria de um possível comprador.

Entre as áreas á venda, foram identificadas um terreno dentro da Terra Indígena Uru Eu Wau Wau, dois na floresta Nacional do Aripuanã e um na Reserva Extrativista Angelim.

Muitos vendedores admitem não terem nenhuma prova legal que são os donos da terra. Eles também revelam estratégias para driblar a fiscalização, sendo uma delas deixar a estrada que da acesso ao lote em mal estado para dificultar o acesso de agentes ambientais.

Vale lembrar que, por se tratarem de terras protegidas, não existe uma documentação oficial que legalize a venda. Os invasores usam o CAR (Cadastro Ambiental Rural) para reivindicar as áreas griladas e ai colocá-las à venda, para passar uma impressão de legalidade. Porém o CAR não é prova de direito sob a propriedade por se tratar de um documento autodeclaratório e qualquer pessoa pode registrar parte do território nacional como se fosse dono e usar isso em uma batalha jurídica no futuro.

Atualmente só podem ser regularizadas as áreas ocupadas até 2014, mas o governo e a bancada ruralista pretendem esticar esse prazo, o que facilitaria a regulamentação das ocupações.

Reprodução: BBC News Brasil

O crescimento do desmatamento

Entre agosto de 2019 e julho de 2020, o bioma perdeu cerca de 11mil km2, maior índice desde 2008.

O desmatamento inflaciona o preço da terra pois ela já esta “preparada” para receber alguma atividade econômica como a agropecuária e a plantação de soja.

As duas áreas à venda na Floresta Nacional do Aripuanã, que não poderia ser vendida por se tratar de uma floresta nacional, estava sendo anunciada á 3,2 milhões no total, e o espaço equivale a 1.660 campos de futebol. Uma consulta no site do CAR diz que área está 100% dentro da Floresta Nacional do Aripuanã e tem 98,6% do território coberto de mata nativa. Porém, o anúncio por sua vez, aponta a área “pronta para a agricultura”.

Quando a equipe da BBC contatou o vendedor, ele disse que só poderia passar o terreno após o envio de uma carta de intenção de compra, e que deveria contatar o dono que em nenhum momento foi revelado. Ele sugere desmatar 50% de cada lote, sendo isso uma irregularidade pois o Código Florestal diz que os donos de terras na Amazônia devem preservar pelo menos 80% da propriedade.

Quando questionado sobre os possíveis empecilhos envolvendo a fiscalização e as organizações ambientais, o vendedor assim como todos os outros presentes no documentário, mostrou acreditar que elas seriam supridas pelo governo atual.

“Aqui pra gente ir no INCRA pra fazer as coisas, é uma propina ali e outra propina lá. E calado viu? Para poder abrir as alas pra gente. Agora o empecilho do meio ambiente né, com os índios, os negócio dos índios. Mas o Bolsonaro vai passar por cima e a tendencia é asfaltar até Manaus.”

Disse o corretor para o suposto comprador
Reprodução: BBC News Brasil

Criação de gado

A equipe da BBC vai até o interior de Rondônia, Ariquemes, investigar a criação de gado e o impacto na destruição da Amazônia.

O terceiro vendedor anuncia um lote no Facebook dentro de uma reserva extrativista, ou seja, uma área destinada a comunidades tradicionais que não poderiam estar a venda.

O Lucas, nome fictício para o suposto comprador junto da equipe da BBC, diz que os vendedores deixam claro que estão ciente que se não ocuparem a área vai ficar uma reserva estadual, mas se conseguirem ocupar e derrubar, eles podem conseguir legalizar a área.

99,9% da madeira é ilegal

Diz o vendedor

Mais da metade das áreas de floresta derrubada, viram pastagem na Amazônia, e os bois seguem o mesmo esquema das madeiras ilegais.

Mas que esquema é esse?

As toras são registradas como se tivessem saído de florestas onde a extração é permitida. As madeireiras permitidas a explorar dizem ter extraído mais madeira do que realmente havia no local. Para os bois é o mesmo esquema.

Destruição de terras indígenas

A ambientalista Ivaneide Bandeira Cardoso, filha de seringueiro, luta contra o desmatamento a mais de 30 anos. Ela fundou a ONG Canindé, que trabalha com povos indígenas para proteger a floresta de invasores.

No documentário, ela conta sobre o caso de Ari, membro da maior comunidade indígena de Rondônia, a Uru Eu Wau Wau, assassinado em 14 de abril de 2020. Ninguém foi preso pela morte de Ari.

Um relatório da ONG Global Witness, aponta que 24 ativistas e defensores dos direitos humanos foram assassinados em 2019. Sendo dez deles, indígenas.

Em encontro gravado com câmera escondida, o pretenso proprietário do lote no município de Buritis (RO) admitiu que a área fica dentro da terra indígena, mas disse integrar um grupo que busca regularizar a ocupação com autoridades em Brasília. Ele também disse esperar que o caso seja solucionado pelo governo Bolsonaro.

A BBC encontrou Bitate Uru Eu Wau Wau, jovem de 20 anos e líder da principal associação da terra indígena. Sob sua liderança, a comunidade criou um grupo para monitorar invasores. No documentário é possível ver Bitate e o grupo em ação.

Terra Indígena Uru Eu Wau Wau é uma das áreas protegidas que tiveram pedaços anunciados ilegalmente no Facebook; líder Bitaté (à esq.) cobrou providências. // Créditos: BBC News Brasil
Líder Bitate a esquerda. // Reprodução: BBC News Brasil

Quando mostrado o anúncio o líder afirmou ser uma falta de respeito e cobrou do Facebook e do governo providências.

“Eu não conheço essas pessoas. Acho que o objetivo delas é desmatar a terra indígena, desmatar o que está de pé. Desmatar as nossas vidas, vamos dizer assim.”

Diz Bitate

Questões políticas

Durante todo o documentário, é possível ver como os grileiros se sentem tranquilos em relação a impunidade que o governo oferece a esse tipo de prática.

Membros da associação curupira, disseram que o deputado federal Coronel Chrisóstomo é um grande apoiador desses processos. Este veio a candidato em 2018 pelo PSL, partido de Jair Bolsonaro.

A equipe da BBC realizou uma entrevista com o Coronel, e quando perguntado sobre as afirmações feitas pelo grupo curupira o deputado diz ter ajudado o grupo a se reunir com o INCRA, o Ministério do Meio Ambiente e a Funai, mas que não sabia que eles haviam invadido uma terra indígena…

De volta a São Paulo, o jornalista João Fellet levou os dados encontrados na investigação até o Ministério do Meio Ambiente.

Quando perguntado sobre os dados, Ricardo Salles diz que o governo Bolsonaro sempre deioxu claro ser uma mandato contra crimes, inclusive os ambientais. Em seguida ele aponta que isso não significa que as premissas da legislação não podem ser discutidas.

“O que o governo vem defendendo desde o início de 2019 é que alguns aspectos da legislação fundiária no Brasil, precisam ser revistos.”

Diz Ricardo Salles, Ministro do Meio Ambiente.

O repórter questiona o porquê de o desmatamento ter se tornado tão alto nesses últimos anos e se não há nenhuma autocrítica em relação as ações do governo. O Ministro por sua vez afirma que é preciso combater as ilegalidades em conjunto com órgãos como o Ibama, ICMBio, Polícia Federal e todos os Estados juntos.

Vale lembrar que o IBAMA teve uma redução de 40% dos gastos com fiscalização desde 2018.

Ricardo Salles finaliza dizendo:

“É preciso entender o problema da Amazônia nas suas diversas facetas. Uma delas é o desmatamento por uma questão de fiscalização. De outra, por outro lado, é a ausência de alternativa econômica. E o governo federal neste mandato vem colocando bastante força para que a agenda da bioeconomia saia do papel.”

Ele criticou o Congresso por não ter aprovado a Medida Provisória 910/2019, que facilitaria a regularização de áreas desmatadas ilegalmente, e disse que o desmatamento também deve á pobreza existente na Amazônia.

Conclusão

Recomendamos muito a todos assistirem o documentário e a lerem a matéria da BBC escrita pelo João Fellet.

O Facebook se pronunciou em uma nota oficial que dizia: As nossas políticas comerciais exigem que compradores e vendedores cumpram as leis e regulações locais quando compram ou vendem no Marketplace. Estamos à disposição para trabalhar com as autoridades locais em qualquer uma das questões levantas das investigações da BBC.

O que é evolução para você? É destruir a Amazônia, e o meio ambiente, ao ponto de que você mesmo não tenha futuro em nome de uma evolução que só tem destruição? Ou é, buscar o equilíbrio de saber conviver com a floresta e dela tirar o equilíbrio do clima, ter uma economia que seja sustentável…

A Floresta Amazônica ja perdeu 20% de sua cobertura original. Se a destruição não for freada, cientistas comprovam que a floresta vai perder a capacidade de se autorregular e começara a secar por conta própria.

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