Justiça determina volta do livro ”O Menino Marrom” em escolas de Minas
Na Secretaria Municipal de Educação de Conselheiro Lafaiete, pais de alunos pediram a suspensão do livro “O Menino Marrom” de Ziraldo, lançado em 1986.
O livro conta a história de dois meninos: o menino marrom e o menino cor-de-rosa. Juntos, buscam desvendar os mistérios das diferenças, questionando quem determinou que o oposto de preto é branco, em uma narrativa didática e leve.
Pais de alunos explicam que o livro incita à violência e induz as crianças a ‘’fazerem maldade’’.
“Como pode durar esse jogo de deus e de diabo em peito de menino?”
Em uma das passagens do livro, o ‘’menino marrom’’ revela que gostaria que uma velhinha fosse atropelada. Este trecho preocupou os pais, os quais alegaram que tal passagem serve de incentivo à violência.
Bem, analisemos o contexto. O narrador conta que, ao caminhar sozinho no meio da rua, viu uma velhinha atravessar a rua a caminho da missa das seis.
O menino corre para ajudar a velha, no entanto, é surpreendido com rudeza. Ela lhe dá um tapa na mão, sai, deixando-o triste e confuso sobre sua reação.
Nas manhãs seguintes, ele passa a observar a senhora caminhar pela rua sozinha, fazendo sempre o mesmo trajeto. O menino cor-de-rosa o questiona: ‘’Por que você vem todo dia ver a velhinha atravessar a rua?’’. E o menino marrom responde: ‘’Eu quero ver ela ser atropelada.’’. Em seguida, o narrador levanta o seguinte questionamento diante dessa afirmação: “como pode durar esse jogo de deus e de diabo em peito de menino?”
“É fundamental entender o contexto de uma obra. Como compreender os dilemas de um personagem se não identificarmos os costumes, valores e crenças que orientam seu comportamento?”
Segundo Zoara Failla, socióloga e coordenadora da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, do Instituto Pró-Livro
‘’Fiéis para sempre!’’
Outra passagem que levantou questionamentos é o pacto de sangue que os meninos fazem para selar a amizade. Sem coragem de cortar os pulsos, escolhem um alfinete e tinta azul, já que não tinham tinta vermelha, para simular o sangue. Tal ato demonstra um pacto de amizade e lealdade entre os amigos, sendo uma das temáticas principais na narrativa do livro.
‘’Censurar livros é atacar a democracia’’
Em nota publicada no dia 21 de junho deste ano, a Editora Melhoramentos, que possui os direitos de publicação, afirma que a censura ao livro ‘’O Menino Marrom’’ e também ao recolhimento da obra ‘’Meninas Sonhadoras, Mulheres Cientistas’’, a qual também sofreu retaliações, ‘’ são atos inaceitáveis que configuram um claro ataque à liberdade de expressão, pilar fundamental para a democracia e o desenvolvimento de um país.’’.
Mas não foi dessa vez!
No dia 26 de junho, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) determinou o retorno do livro às escolas de Conselheiro Lafaiete. O juiz Espagner Wallysen Vaz Leite decidiu provisoriamente que a suspensão temporária das atividades pedagógicas deve ser cancelada imediatamente. Se essa decisão não for seguida, pode resultar em uma multa de R$ 5 mil por dia, cabendo a possibilidade de recurso.
Em um comunicado divulgado nas redes sociais em 28 de sexta-feira, a prefeitura de Minas Gerais afirmou que o livro será mantido nas escolas da Rede Municipal, seguindo o plano pedagógico elaborado pelas equipes responsáveis:
“As atividades em sala de aula com o livro foram suspensas temporariamente em 18/06, não por censura ou intenção de exclusão, mas para que a equipe pedagógica da SEMED pudesse reunir-se e planejar ações em resposta a diversas solicitações e questionamentos de pais, autoridades e comunidade”
Além disso, adicionalmente, a prefeitura enfatiza que a obra de Ziraldo é “fundamental para a educação dos jovens”, abordando temas como diversidade, preconceito, aceitação e amizade, essenciais para a formação cidadã e o desenvolvimento de valores humanos.
Se você ficou interessado no assunto e gostaria de abranger o debate e a opinião sobre, recomendamos o podcast O Assunto, da Natuza Nery, episódio ‘’Ziraldo suspenso e o revisionismo literário’’.